Tuesday, March 10, 2009

António Toni

Parte ! - Amor Lipído

Toni nasceu no dia como os outros. Ficou assente que não choviam canivetes como se conta por ai. Corresponde à verdade, no entanto, que foi o primeiro bebe de quem se soube nascer com dentes. Pequeninos e desenvoltos, desde logo cariados, conferiam à sua cara pálida, juntamente com os seus olhos amarelos um tom poético quase cómico se não fosse tão estrábica a sua trágica existência. Tinha olhos de chinês ou mongol, bem pequenos, proporcionais ao cérebro. Disse a primeira palavra aos doze anos e foi a prima Ana que a ouviu.
-AU! – disse repetidamente enquanto tentava, pelo empirismo, descobrir que parte da cabeça não doía quando lhe batia com o martelo.
Conta-se que o pai ficou bêbado de felicidade e mãe feliz de alívio do seu filho não ter nascido com a marca no corpo do caso que ela tinha tido com o senegalês da obra em frente à sua barraca.
Era um tipo porreiro e tal. Passeava, todos os dias, desatento até que um dia andava tão distraído que se apaixonou por uma gorda, nascida de 4 a 6 de Fevereiro, órfã de mãe desde logo, que nunca recuperou da cesariana até ao tórax.
Se gordura é formosura então ela era badocha de beleza.
Luz no Coração, a bucha.
Morava ao pé dos caniços obesos lá no bairro numa rua lamacenta com um riacho aromático pintado de lixo e com cheiro a condizer. Diziam os vizinhos que não se importavam, apesar do lixo, com o cheiro da família da Luz no Coração, a bucha, até no fedor em grande escala.
Todos os amigos perguntaram como era possível, como tinha acontecido. Não é que não gostassem de gordas, apenas as preferiam no jardim zoológico.
- Tás a curtir com uma anafada?
- Distraí-me…» – disse ele envergonhado.
Tanta confusão apenas porque a Luz no Coração não tinha o que as gordas tinham e que sabia tão bem. De peito reduzido e barriga exacerbada a nossa querida Luz no Coração era, digamos, uma mesa de passar a ferro obesa.
Toda a gente desculpava a Luz no Coração, a gorda até porque vida dela estava recheada de algumas tragédias.
Quando nasceu parece que não tinha lábios. O pai, inflamado pelo amor fraterno resolveu dar-lhe uns pelos anos. Talvez tenha sido o pior aniversário dela porque, embora tenha ficado com uns beiços novos, o pai foi preso e encarcerado, julgado e preso nesse mesmo dia.
-Eu não sabia que era ilegal!
O que é certo é que de facto era. Pelo propósito ser uma boa acção equacionou-se o perdão.
-És o pai da Luz no Coração, a gorda?
-Sou sim senhor! – disse orgulhoso.
Foi condenado a 3 anos de prisão.
Serviu de lição à família, que nunca mais roubou pneus de camiões, e nunca mais se referiu à ovelha obesa, eventualmente semi-negra da família.
Depois de algum trauma lá seguiu, lentamente devido ao peso, a sua pobre vida.
No ímpeto da primavera escondiam-se escondidos por entre as árvores para andarem lá refundidos nos disparates do amor.
Sucedia com frequência a mãe do Toni, nos entretantos daqueles aqueles desencontros encontrados, controlados pela paixão, chamá-lo para jantar, que não eram bolotas embora nesse aspecto ele de um porco se tratasse.
-Tenho um assunto em mãos – berrava mentiroso dado que as tetas da Luz no Coração não justificavam, de pequeninas que eram, tal insígnia para Toni tão importante.
Claro que demorou, mas percebeu que nem todas as gordas eram assim. Havia umas mais magras, sem estrias e congéneres, pelo que sempre se podia aventurar um pouco, porque até as gordas precisam de amor.